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quarta-feira, julho 29

Beto porra

A mesa tinha de ser grande para comportar um verdadeiro exército: os pais, os avós, de vez em quando um tio abrigado por estar desabrigado ou tuberculoso, e mais quatro filhos. Às vezes cinco. Cinco. Fora, claro, os fugitivos de uma São Paulo em guerra contra a ditadura militar.

A filha mais velha, já fora de casa, mandava alguns para a casa grande quando a coisa apertava com algum estudante. Era mais um para ocupar aquela mesa. Ok, ocupava o lugar da primogênita. Mas era mais um para comer da mesma comida que muitos senadores, diplomatas e outros homens e mulheres importantes já tinham comido ao terem passado por aquela mesa. Mais um para fazer barulho e interromper uma possível refeição em paz, paz essa imposta às duras penas, já que, só de filhos, eram cinco. Cinco.

Alguns desses enviados especiais eram ilustres desconhecidos de todos. Inclusive da responsável por mandá-los. Um deles, tinha a alcunha de Beto Porra. Isso mesmo, sem sutilezas. O apelido vinha do fato de o sujeito não usar vírgulas, mas, sim, porras. Ele, o general, até que tinha paciência com a filha, afinal, estava longe, aos 20 anos, cuidando da própria vida. Recebeu outros "delinqüentes" sobre os quais não sabia - ao menos oficialmente - que eram "procurados pela justiça".

Gente boa, a filha. Conhecia alguém que estava em apuros e imediatamente sugeria que ele passasse uma temporada na Cidade Maravilhosa, num dos melhores esconderijos. Ninguém poderia imaginar, nenhum policial do doi codi, nenhum militar imaginaria que naquela casa de classe média do Alto Leblon, ali, onde viviam os avós, os pais, mais um tio eventual, cinco crianças, e, ah, a babá, claro, a babá!, estaria escondido algum fugitivo da polícia. Até porque tratava-se da casa do general. Ele mesmo. Geisel. Ok, não propriamente o Homem, mais do seu legítimo sósia, que nem precisava de medalhas, fardas ou continência para ser parecido com o sujeito. Ele, que tanto prezava uma refeição calma, em silêncio, em paz.

Mas, Beto Porra, nunca mais.

2 comentários:

Nicolau disse...

Exclente (para variar).

Por motivos muito diferentes eu devo confessar que quando eu era criança, e tantas eram as merdas que eu fazia, meu nome completo era Porra Nicolau. Vai ver eu tenho um parentesco qualquer com o Beto.

Beijos

missbutcher disse...

Hahahaha.
Nicolau,

acho que todos nós já passamos pela fase do porra como nome ou apelido...