Para alívio dos meus pais, desde pirralha, passava boa parte das férias em outro estado, bem longe, para eles poderem se curtir um pouco.
Passava com Ela.
Talvez eu já soubesse desse certo desprezo/medo que ela tinha por crianças. Instinto, sei lá. Mas o estranhamento era mútuo. Talvez a distância entre Campinas e Rio de Janeiro também fosse um problema entre nós. Só nos víamos uma, duas vezes por ano, confinadas numa casa por um mês inteirinho. Uma olhando para a outra.
A casa era ótima. Não lembro com detalhes, mas lembro que, no quintal, lá estava ele. Sim, para mim era um ele. Pela forte influência paulista na minha vida, nunca tomei banho de mangueira, mas de esguicho. E ele era o responsável pela minha maior diversão. E tormento para Ela.
Tinha 3, 4 anos, no máximo. Mas, já naquela idade de micro-ser dei muita dor de cabeça pra muita gente. Mas em especial pra Ela. Não comia com ela, não tomava banho com ela. Era preciso uma minha tia e uma dela amiga pr'eu poder tomar banho. "Você vai me enlouquecer, menina!, sabe disso? Você vai me enlouquecer!", gritava pela casa. Com as duas eu me fartava. Adorava. Abria a torneira, esperava calmamente a água sair forte e colocava o esguicho em cima da cabeça. E tomava aquele banho.
E assim nasceu a nossa história de amor. Início de muitas férias juntas. De muitas farras, esguichos e cabelos brancos.
Para dona Aparecida.